O sentido de não sentir

Sobre os símbolos na psicologia junguiana.

Quantas vezes passamos por situações que não fazem o menor sentido para nós, ou quantas vezes temos o sentimento de que nossa vida não tem significado algum?
Em momentos assim é que começam a surgir perguntas como: Para que estou aqui? Qual o sentido da vida? Porque não consigo enfrentar essa situação? Porque tenho que passar por isso?
Sempre temos muitas perguntas, muitos “porques” sem respostas, ou respostas que não fazem sentido para nós, mas acreditem, existem maneiras de encontrar respostas, é claro que não da forma que estamos acostumados, ou seja, de forma racional e organizada.
Por exemplo, tenho certeza que muitos estranharam o titulo de post …

O sentido de não sentir

Mas existe uma razão e vou tentar fazer esse titulo fazer algum sentido até o final!

Antes de seguir com este post acho importante fazer um distinção entre o que é simbolo e o que é signo através de uma explicação dada por Edinger:

O homem necessita de um mundo de símbolos, assim como necessita de um mundo de signos. Tanto o signo como o símbolo são necessários, mas não devem ser confundidos entre si. O signo é unidade de significado que representa uma entidade conhecida. A partir dessa definição, a língua é um sistema de signos, e não de símbolos. O símbolo, por outro lado, é uma imagem ou representação que indica algo essencialmente desconhecido, um mistério. O signo veicula um significado abstrato e objetivo, ao passo que o símbolo veicula um significado vivo, subjetivo. O símbolo é dotado de um dinamismo subjetivo que exerce sobre um individuo uma poderosa atração e um poderoso fascínio. Trata-se de uma entidade viva e orgânica que age como um mecanismo de liberação e de transformação de energia psíquica.  Podemos dizer então que o signo é morto e o símbolo é vivo.
Os símbolos são um produto espontâneo da psique arquetípica. Não é possível fabricar um símbolo; só é possível descobri-lo. Os símbolos são portadores de energia psiquica. Eis porque convém considerá-los vivos.

Agora que sabemos a diferença entre um signo ( o signo pode ser entendido como sinal também ) e um símbolo podemos seguir…

Vamos lá, imaginem, por exemplo, os sentimentos que aqui vou chama-los de sintomas e que somos incapazes de controlar, como medo, raiva ou sentimentos de impotência ou outros exemplos fisiológicos como dores, tremedeiras nos olhos, cansaços ou outras doenças que podem ser abordadas através do entendimento de que são somatizações de origens emocionais.
Quantos de nós já fomos ao médico e ouvimos: Você não tem nada, seu problema é emocional!
Jung tornou possível responder as mais difíceis questões da vida cotidiana através dos símbolos, de tal forma que nos oferece a possibilidade de entender o sentido das coisas que não fazem sentido para nós; usando as palavras de Jung o símbolo é “a melhor representação possível de alguma coisa que jamais poderá ser conhecida plenamente.”
Somente a vida simbólica pode expressar a necessidade de alma.
                                                                                                     Jung
Foi por isso que coloquei esse titulo, pois, através dos símbolos é possível entender algo que para nós não é possível entender de forma racional.
Em muitos momentos olhamos para nós mesmos e percebemos que algo não está bom, que a vida não está da maneira que gostaríamos, mas todas essas percepções são racionais, contudo, subjetivamente quase sempre sabemos o que não está bom ou qual seria a maneira que a vida deveria estar.
Essa semana enquanto eu pensava sobre o que eu iria escrever notei algo comum no meu dia a dia, seja no consultório ou não, notei que muitas vezes fazemos algo que não tem sentido para nós mesmos, e mesmo assim, apesar do desconforto ainda continuamos a fazer porque simplesmente não temos força para fazer diferente.
Por isso resolvi falar um pouco sobre símbolos, pois através deles podemos, apesar de todo o desconforto ainda, realizar determinadas coisas ainda que não agradáveis, mas com um sentido.
Afinal, quando encontramos um sentido para o que estamos fazendo, seguimos em frente apesar de todo os desconforto.
Antes de prosseguir acho interessante entender a origem da palavra símbolo, gosto da explicação dada por Edinger:

A palavra símbolo vem da palavra grega symbolon, que combina duas raízes – sym, que significa junto ou com; e bolon que significa aquilo que foi colocado. O significado básico é, por conseguinte, “aquilo que foi colocado junto”. No uso grego original, os símbolos referiam-se às duas metades de um objeto, tal como uma vara ou uma moeda, que duas partes dividem entre si como um sinal de compromisso e que mais tarde serve de prova de identidade daquele que apresentar uma das partes diante daquele que está de posse da outra. O termo correspondia à palavra inglesa tally [entalhe], que o dicionário Webster descreve do seguinte modo: “após marcar numa vara, com entalhes, a quantidade ou o número de bens enviados, os comerciantes costumavam dividir essa vara em sentido longitudinal, passando por todos os entalhes, de modo que as metades resultantes correspondessem entre si exatamente, ficando o vendedor com uma das partes e o comprador com outra”. Portanto, um símbolo era, originalmente, uma tally, referindo-se à parte de um objeto que colocado junto dela, recriava o objeto inteiro original. Isso corresponde à nossa compreensão da função psicológica do símbolo. O símbolo nos leva à parte que falta do homem inteiro. Ele nos põe em relação com nossa totalidade original e cura nossa divisão, nossa alienação da vida. E como o homem total é bem maior que o ego, o símbolo nos põe em relação com as forças suprapessoais que constituem a fonte de nossa existência e do significado que temos. Essa e a razão para que se honre a subjetividade e para que se cultive a vida simbólica. P.182

A partir do entendimento pessoal que se forma através de um símbolo, encontramos uma luz na escuridão por se tratar de um conteúdo subjetivo e que faz parte do coletivo, Jung explica que “se o doente percebe que o problema não é apenas seu, mas sim um mal geral, até mesmo o sofrimento de um Deus, ai então reencontrará seu lugar entre os homens e a companhia dos deuses; e só de saber isso, o alívio já surge.” p.120
Complementando Jung diz que “é provável que um símbolo adequado e impressionante possa mobilizar as forças do inconsciente a tal ponto que até o sistema nervoso seja afetado, levando o corpo a reagir de maneira normal novamente.”
Quando não estamos conscientes da força atuante de um símbolo em nosso cotidiano, nos tornamos vítimas e passamos a viver de forma concreta o significado de determinado símbolo.
Nas palavras de Edinger: “Um sintoma paralizador, produtor de culpa, pode ser substituído por um símbolo significativo e enriquecedor da vida, que é experimentada de forma consciente – e não vivida de forma inconsciente. compulsiva e sintomática.
E mais
“A capacidade de reconhecer o arquétipo, de ver a imagem símbólica oculta no símbolo, transforma imediatamente a experiência, que pode permanecer tão dolorasa quanto antes, mas agora tem sentido.”
Fiz questão de deixar as ultimas palavras grifadas porque é o ponto principal a ser encontrado quando resolvemos buscar ajuda, neste momento estamos em busca de sentido, em busca de nós mesmos, pois, enquanto se continua a viver sem sentido adoecemos.

 

Além de viver, precisamos vivenciar a vida de forma plena!!


Daniel Gomes
psicoterapeuta junguiano
dgterapia@gmail.com
 
referencias
JUNG, Carl Gustav. A vida simbólica vol.1 
Edinger, Edward F. Ego e arquétipo
Hopcke, Robert H.Guia para a obra completa de C. G. Jung

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