“Cansei do que eu faço…e agora?” – Um bate papo sobre a insatisfação profissional

Falar sobre mudanças profissionais não é fácil mas acho que se torna mais descomplicado quando se vive isso. Não só passei por isso como escuto este tipo de relato com frequência no consultório e em círculos de amizade.
Parece que mais do que nunca este é um assunto que está gerando muita angustia e forçando as pessoas à refletirem sobre isso. O momento de crise nos faz repensar o que estamos fazendo da nossa vida profissional; um desemprego faz a gente conviver com um outro eu que não mais se encaixa na persona do profissional e também é valiosíssimo para avaliarmos qual rota queremos seguir; um amigo que muda de vida nos faz com certeza olhar para nossa história e enxergar o que está acontecendo conosco. Enfim, a vida nos dá várias possibilidades de entrarmos em contato com o nosso interior e escutar se o que estamos fazendo é realmente aquilo que gostaríamos de fazer.
A terapia junguiana não é muito amiga de uma padronização (como já falamos em outros posts) e por isso que é amada por uns mas também assusta um pouco os outros. Mais do que se adequar ao que a maioria acha bacana, ela faz você se perguntar o que faz sentido para você, mesmo que a ideia não venha com uma aprovação de pais, amigos, de pessoas mais próximas. Mais do que agradar a todos, tem que te agradar. Mais do que fazer sentido para os outros, tem que fazer sentido para você. Ao mesmo tempo que pensar desta forma é libertador, aumenta proporcionalmente a responsabilidade sobre suas escolhas e decisões, uma vez que a desculpa “o outro não deixou”, “segui o que fulano queria e não deu certo” não caberá mais. Mas mesmo assim digo e afirmo que vale a pena pegar as rédeas da sua vida e ser responsável pelo seus passos. Para Jung, “o significado da vida é a realização do self” (JAFFÉ, Aniela, O mito do significado, p79)
Jung ainda fala que devemos descobrir nosso Mito do Significado, ou seja, qual é o nosso mito? Qual o sentido da nossa vida? Qual o significado da nossa existência? E isso é muito profundo pois vem seguido de uma ideia de que o nosso Self (nossa totalidade) precisa se realizar, logo devemos escutá-lo e dar voz ao seus anseios. Uma vida em que se luta e gasta energia diária para alimentar as vontades do ego se torna extremamente vazia e carente de sentido ao longo dos anos. E na metanóia (segunda metade da vida), este sentimento de vazio se torna mais evidente e cobrará uma conscientização sobre tudo o que não foi feito para sua evolução.  
Infelizmente nossa cultura ocidental não ensina os jovens a pensarem naquilo que realmente gostariam de fazer mesmo que não recebessem por isso; não ensinam a sentirem qual é o chamado da vida deles; pelo contrário, tanto nossos pais quanto o meio em que vivemos ensina que a pessoa bem sucedida é aquela que acumula mais bens materiais; que tem mais riquezas no banco, mais títulos arquivados e também o emprego mais disputado por todos. E isso vem seguindo de forma automática porque eles também cresceram ouvindo que esta é a melhor saída, que esses ganhos iam garantir a felicidade de uma vida plena e realizada. Com isso, quantos trabalhos são menosprezados ou quantos profissionais não se valorizam porque não se encaixam no padrão descrito acima. Daí que a angustia e frustração começam a tomar conta do indivíduo que passar por isso.
De um tempo pra cá, muitos profissionais decidiram tirar um ano sabático para descansar, cuidar de algum projeto pessoal ou mesmo repensar na vida. E quanto eles estimulam outros colegas a fazerem o mesmo ou até fantasiarem a possibilidade. Não acredito que quem realmente tem a coragem de tirar este tempo seja apenas por cansaço; isso umas boas férias resolveriam. Acredito que a tentativa já veio vindo por meses até que a pessoa entende que se não se desligar daquilo para conseguir se escutar e ver a situação de longe não encontrará nenhuma resposta. Fica como um ensaio de uma nova vida, um ato de coragem com a calma psíquica de que um dia eu posso voltar. Eu não vejo problema algum neste “ensaio”. Mas simplesmente largar uma condição não garante que a outra virá como um milagre. É aí que um acompanhamento terapêutico auxilia a pessoa a se entender e pensar no que deve fazer, muitas vezes sem ter que interromper um trabalho para isso. No processo, poderá se concluir que o caminho profissional é outro, mas que por um período o trabalho atual será útil para financiar um novo estudo e proporcionar a mudança de profissão – tirando o peso e ensinando a enxergar gratidão pelo trabalho atual, pois você saberá que é provisório. Em outros casos, o processo indicará a necessidade de uma mudança imediata, fortalecendo o ego para o desapego da antiga persona e reunir esforços para o novo, para o que vai trazer sentido à nova vida.
Enfim, cada um encontrará uma resposta e, ao escutar o chamado, certeza que a realização pessoal virá. O seu ofício terá um outro significado, você enxergará além do papel que te caberá exercer. Mesmo diante dos primeiros obstáculos, a certeza de que está no caminho certo não o deixará desistir. Você não será mais um, porque o seu chamado te torna único em sua função. E com amor, dedicação e alma…todo e qualquer trabalho está destinado ao sucesso.  
“A falta de significado inibe a plenitude da vida, e, portanto, equivale à doença”
Carl Gustav Jung
Marcella Helena Ferreira
Psicoterapeuta Junguiana

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